Ouço muitos conselhos sobre como conseguir trabalho. Dicas de currículos, como se portar numa entrevista, criar uma rede de relacionamentos e por aí vai. Tento seguir a maioria das orientações para sair desta nova temporada de ociosidade forçada, que já dura três meses e meio e não tem perspectivas rápidas de terminar logo. Uma delas é difícil de cumprir. É aquela que pede para citarmos os ganhos reais proporcionados pelo nosso trabalho às empresas pelas quais passei quase 30 anos de jornalismo.
Sou do tempo que os diretores da área comercial raramente passavam pelas redações, especialmente, as de TV. A preocupação com audiência, com anunciantes, com faturamento, era deles e das nossas chefias. Para o chão de fábrica, digo, para os peões das redações, o foco estava em fazer um bom jornal. Se fosse assistido, ótimo. Se ninguém visse, ótimo também, desde que o salário fosse pago religiosamente em dia. Também não havia o jornalismo de entretenimento, de espetáculo, que faz com que os cabelos e as sobrancelhas da apresentadora chamem mais atenção do que a qualidade do jornal que ela produz. É claro que, se o Bonner apresentar o JN de camisa aberta e de óculos escuros será um fato incomum, mas não foi para isso que meus colegas de profissão e eu gastamos anos nas faculdades para levar ao público. E mais: antes de entrar no ar, é obrigação do diretor de TV, do editor-chefe do jornal, perceber o que está errado com os apresentadores.
Voltemos ao currículo. Um engenheiro pode mostrar que construiu x prédios ou um médico tem experiência de n atendimentos. Já o jornalista de redação, que não tem o hábito de arquivar as edições ou os scripts que fez (se tiver alguém que faça isso é uma grande exceção), não tem como dizer que foi responsável direto pelo aumento da audiência ou tiragem de determinado jornal. Não é um ponto quantificável. Qualquer inovação na TV é resultado de longas reuniões com diretores de vários departamentos. Você até pode dizer que descobriu aquele "furo", aquela notícia exclusiva. Só que não é um esforço solitário. Por isso, me incomoda quando os apresentadores são mostrados como estrelas, quando na verdade são a parte final de um trabalho que começa na véspera, envolve uma extensa cadeia de produção, esta sim a verdadeira estrela do jornal. O público em geral não sabe que o apresentador, com raras exceções, não editou as imagens que vão ao ar e tampouco escreveu o texto que leu.
Trabalhei em praticamente todas as TVs abertas de SP.Sou fundador do Band News e do Leitura Dinâmica Primeira Edição, por exemplo. Editei programas líderes de horário como o Bom Dia São Paulo e outros que davam traço de audiência. Em todos, certamente, dei ganhos aos empregadores. Para começar, na maioria deles era mal pago e acumulava funções. Um profissional barato e eficiente é lucrativo para as empresas. Não sei como quantificar isso.
Nesta terrível temporada de aposentadoria forçada por falta de serviço, passei por duas entrevistas. Uma delas foi antecipada por mim em um dia. Meus entrevistadores deram um chá de cadeira de mais de uma hora, sendo que eles tinham marcado o horário. Cheguei a ir para o trabalho. Faltando menos de um quilômetro para chegar ao local, fui avisado que tinha perdido a vaga por uma questão política. Meu concorrente tinha um padrinho mais forte. Na outra entrevista, que seria a realização de um sonho de trabalhar num lugar que todo jornalista esportivo sério pensa em ocupar, achei que a vaga também seria minha. Seria se tivesse um padrinho poderoso. Por isso, desconfio das empresas de recrutamento e dos anúncios de emprego. Podem ser bons para executivos ou professores, mas não funcionam para jornalistas.
Lady Gaga (não), Paris Hilton (não), Justin Bieber (quem ?), Corinthians (sempre), mulher (sempre), rock (sempre), jazz (sempre), sertanejo (longe daqui), crônicas, baboseiras, bobagens, divagações, filosofias, conversas para bois (e vacas) dormirem, papos sem pé e sem cabeça, digressões, piadas, anedotas, observações, pílulas, sagas, prosopopeias...
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