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quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Ministro (crônica genial e atual do Drummond)

Nesta quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012, é bem provável que Mário Negromonte apresente a renúncia ao cargo de ministro das Cidades. Se não for neste dia, será nos próximos. A presidente (acho pedante presidenta) deve trocá-lo por alguém do mesmo partido, o que significa que nada vai mudar na ordem do ministério e, muito menos, melhorar a situação das cidades brasileiras.
Coincidentemente, nesta madrugada, li uma crônica do mestre Carlos Drummond de Andrade, que tem tudo a ver com as constantes trocas no ministério da dona Dilma. Ela está  no livro De notícias e não notícias faz-se a crônica, da editora Record. Vou reproduzi-la:

Serás Ministro


- Esse vai ser ministro - sentenciou o pai, logo que o garoto nasceu.
- E você, com esse ordenado micho de servente, tem lá poder pra fazer nosso filho ministro? - duvidou a mãe.
- Então, só porque meu ordenado é micho ele não pode ser ministro? A Rádio Nacional deu que Abraão Lincoln trabalhava de cortar lenha no mato  e chegou a Presidente dos Estados Unidos.
- Isso foi nos Estados Unidos.
- E daí? Nem eu estou querendo tanto pra ele. Só quero uma de Ministro.
-Tonzinho, deixa isso pra lá.
- Pra começar, a gente convida o Ministro pra padrinho dele.
- O Ministro não vai aceitar.
- Não vai por quê? Trabalho no gabinete há dois anos.
- Ele é muito importante.
- O Ministro é tão ocupado, você mesmo diz. vê lá se tem tempo pra batizar filho de pobre.
- Pois sim. Ele me trata com toda a consideração, de igual pra igual. Hoje mesmo eu faço o convite.
Fez. O Ministro não pode comparecer, mas enviou representante. era quase a mesma coisa. na hora de dizer o nome do menino, o pai não vacilou; disse bem sonoro:
- Ministro.
- Como? - estranhou o padre.
- Ministro, sim senhor.
A mulher ia atalhar: "Tonzinho, não foi Antônio de Fátima que a gente combinou? " mas era tarde.
No cartório, também estranharam:
- Ministro por quê?
- Porque eu escolhi. Acho lindo.
- Não é nome próprio.
- Pois eu cá acho muito próprio. Não tem aí uma família chamada Ministério, aliás com pessoas distintas, médicos, dentistas etc?
- Tem.
- Pois então. Meu filho é Ministro, só isso. Ministro Alves da Silva, futuro cidadão útil à Pátria. Tem alguma coisa demais?
O garoto registrou-se . Cresceu. Na escola, achavam-lhe graça no nome. Parecia apelido. Depois, o costume. Há nomes mais estranhos.Ministro não era o primeiro da classe, mas também não foi dos últimos.
Já moço, o leque das opções não se abriu para ele. Entre o ofício sem brilho e o andar térreo da repartição, acabou sendo, como o pai, servente de repartição. Promovido a contínuo.
- Eu não disse? - festejou o pai. - Começou a subir. O máximo que subiu foi trabalhar no gabinete do Ministro.
- Ministro, o sr. Ministro está chamando.
- Ministro, já providenciou o cafezinho do sr. Ministro?
- Sabe quem telefonou pra você, Ministro? A mulher do sr. Ministro. Diz que você prometeu ir lá consertar algumas goteiras e esqueceu.
- Ministro! Roncando na hora do expediente!
Começaram os equívocos:
- Telefonema para o Ministro.
- Qual? O Ministro ou o sr. Ministro?
- Esse Ministro é um cretino! Me fez esperar uma hora nesta poltrona!
- Perdão, Deputado, o senhor está ofendendo o Sr. Ministro.
- Eu? Eu? Estou me referindo a esse animal, esse,,,
Até que se apurasse que o animal era Ministro, o contínuo - que confusão!
O Ministro de Estado, ciente da confusão, recomendou ao assessor:
- Faça esse homem trocar de nome.
- Impossível, Sr. Ministro. É o seu título de honra.
- Então suma com ele da minha vida.
Mandaram para uma vaga repartição de vago departamento. Queixou-se ao pai, aposentado, que isso de se chamar Ministro não conduz a grandes coisas e pode até atrasar a vida.
-Ora, meu filho, hoje no bueiro, amanhã no Pão de Açúcar. E você não tem de que se queixar. Num momento em que tanta gente importante sua a camisa pra ser Ministro, e fica olhando pro céu pra ver se baixa um signo do astral, você já é, você sempre foi Ministro, de nascença! de direito! E não depende de governo nenhum pra continuar a ser , até a morte!
Abraçaram-se, chorando.

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